Da
esquerda para a direita: Rainer Hoess, Monika Hertwig e Katrin Himmler, filhos
ou netos de nazistas
Para os alemães que trazem na assinatura sobrenomes como Himmler, Goering e
Goeth, que pertenceu a infames membros do Partido Nazista, a Segunda Guerra
Mundial é ainda um assunto rodeado de traumas e um período obscuro nas memórias
de família.
Rainer Hoess é neto de Rudolf Hoess, (que não deve ser confundido com o
vice-líder nazista Rudolf Hess) primeiro comandante do campo de concentração de
Auschwitz. Seu pai cresceu em uma vila anexa ao campo a pouca distância das
câmaras de gás, onde brincava, junto com os irmãos, com brinquedos fabricados
pelos prisioneiros.
Rainer se lembra quando sua mãe mostrou a ele, quando ele ainda era
criança, um baú à prova de fogo, com uma grande suástica na tampa. No baú, muitas
fotos de família mostrando seu pai, ainda criança, brincando com os irmãos nos
jardins da casa onde moravam.
A avó de Rainer pedia aos filhos que lavassem os morangos que comiam. As
frutas eram cultivadas no campo e, segundo a avó de Rainer, tinham o cheiro das
cinzas dos fornos de Auschwitz.
"É difícil explicar a culpa, mesmo que não exista razão de eu sentir
culpa. Mas eu ainda carrego isto, eu carrego a culpa em minha mente",
contou Rainer Hoess.
"Também sinto vergonha, é claro, pelo que minha família, meu avô fez a
milhares de outras famílias."
O pai, filho de Rudolf Hoess, nunca abandonou a ideologia nazista e Rainer
perdeu o contato com ele.
Visita
Foi apenas depois dos 40 anos que ele finalmente visitou Auschwitz, para
enfrentar "a realidade do horror e das mentiras que tive todos estes anos
em minha família".
Ao ver a casa onde o pai passou a infância, Rainer conseguia apenas repetir
a palavra "insanidade" e, no centro de visitantes, se encontrou com
descendentes das vítimas de Auschwitz.
Muitos dos descendentes choraram ao contar suas histórias e uma jovem
israelense não conseguia acreditar que Rainer tinha ido até o campo para falar
com eles.
Enquanto ele falava de sua culpa e vergonha, um sobrevivente disse a Rainer
que os familiares dos nazistas não devem ser culpados pelas atrocidades.
"Receber a aprovação de alguém que sobreviveu àqueles horrores e saber
com certeza que não foi você, que você não fez aquilo. Pela primeira vez você
não sente o medo ou vergonha, mas felicidade, alegria", disse.
Livro
Katrin Himmler resolveu escrever um livro para lidar com a culpa de ter
Heinrich Himmler em sua família.
Himmler, um dos arquitetos do Holocausto, era tio-avô de Katrin. O avô e
outro irmão também eram membros do Partido Nazista.
"É um fardo muito pesado ter alguém como ele na família, tão próximo.
É algo que fica com você", disse.
Ela escreveu o livro The Himmler Brothers: A German Family History
("Os Irmãos Himmler: História de uma Família Alemã", em tradução
livre), em uma tentativa de "trazer algo positivo" para o nome
Himmler.
"Tentei da melhor forma me distanciar disto, enfrentar de forma
crítica. Eu não preciso mais ficar envergonhada desta conexão de família."
Para Katrin, os descendentes de criminosos de guerra nazistas parecem ter
duas opções extremas.
"A maioria decide cortar totalmente a relação com os pais, para que
possam tocar suas vidas, para que a história não os destrua. Ou então optam
pela lealdade e amor incondicionais, e limpar todas as coisas negativas."
Ela mesma pensou que tinha um bom relacionamento com o pai até que decidiu
pesquisar o passado da família. Ele tinha muita dificuldade em falar do
passado.
"Eu só entendi como era difícil para ele quando percebi o quanto era
difícil para mim aceitar que minha própria avó era uma nazista."
"Eu a amava muito,(...) foi muito difícil quando encontrei as cartas
dela e descobri que ela mantinha contato com os velhos nazistas e que ela
enviou uma correspondência para um criminoso de guerra condenado à morte. Me
deixou doente."
Lista de Schindler
Monika Hertwig é filha de Amon Goeth, o comandante sádico do campo de
concentração de Plastow, interpretado pelo ator britânico Ralph Fiennes no
filme A Lista de Schindler, de Steven Spielberg.
Ela era apenas um bebê quando Goeth foi julgado e condenado à morte. Monika
foi criada pela mãe e, durante a infância, tinha uma visão distorcida do que
acontecia em Plastow.
"Eu tinha esta imagem que criei (que) os judeus em Plastow e Amon eram
uma família."
Quando era adolescente, ela questionou a mãe e foi chicoteada com um fio
elétrico.
Apenas quando assistiu ao filme de Spielberg, Monika soube de todo o horror
causado por seu pai e contou que "foi como ser atingida".
"Eu pensava que isto (o filme) tinha que parar, em algum momento eles
tem que parar de atirar, pois se não pararem, vou enlouquecer aqui dentro deste
cinema."
Ela saiu do cinema em choque.
Esterilização
Já Bettina Goering, sobrinha-neta de Hermann Goering, o primeiro na linha
de poder do Partido Nazista depois de Adolf Hitler, optou por uma medida bem
mais drástica para lidar com o legado de sua família.
Ela e o irmão optaram pela esterilização.
"Nós dois fizemos... para que não existam mais Goerings. Quando meu
irmão fez, ele me disse: 'Cortei a linha'", explicou Bettina.
Perturbada pela semelhança com o tio-avô, ela deixou a Alemanha há mais de
30 anos e agora vive em um local remoto do Estado americano do Novo México.
"É mais fácil lidar com o passado de minha família à distância",
disse.
Fonte: http://www.bbc.co.uk/
(...)
Um comentário:
Amigo, a FOLHA DE SÃO PAULO está perdendo um GRANDE JORNALISTA, mas o mundo da veterinária está feliz assim.
Até a próxima.
Leonardo Guerra
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